... Sem
aventura, diz Lulu em “O último romântico”. Concordo totalmentão, embora meu
conceito de aventura não envolva abandonar a velha escola nem fazer nada,
absolutamente nada irresponsável (irresponsabilidade não é aventura, é burrice
extrema – não raro suicida). Quando penso em pisar fora da “vida assim”, vou
com todos os equipamentos de segurança, respeitando os riscos e não jogando
pôquer com eles. Aventurar-se não é se colocar em perigo; é, muito ao
contrariomente, tirar-se do perigo da neurose, da senilidade, da gangrena
emocional, do congelamento em vida, porque tromboses malucas devoram ligeiro
quem mora no sofá e no controle remoto, mas uma oxigenação mínima mantém a
combustão dos aventureiros alive and well.
Tolice é
(podendo viajar grande e longe) só viajar de carro ou ônibus porque mantêm as
rodas no chão, ou não viajar at all, já que se pode esquecer algo na mala,
pode-se não gostar do hotel, pode-se passar mal. Aventura é fazer a listinha
esperta de remédios & cia., seguro-saúde, bagagem de mão com o necessário
para uma vida digna caso a mala vá passear em outro hemisfério; é se entregar
às estatísticas que juram pela estabilidade dos aviões, amar a maravilhosa
corridinha da decolagem, se comover quando o trem de pouso toca uma nova terra,
gostar voluntariamente da comida de bordo (a cavalo dado...), aproveitar para
assistir a uns dois filmes que estavam atrasados. Tolice é confiar mais nos
maus que nos bons imprevistos. Aventura é prever o que é possível e achar mui
menos crucial um desgostinho passageiro que uma Paris (Londres, Lisboa)
definitiva.
Tolice é
não curtir montanha-russa porque sim, nunca se tendo abandonado aos amores de
uma. Aventura é topar a volta – se parque e mecanismo forem confiáveis –, pelo
menos para saber se você não gosta mesmo ou se é um medo cultivado e
terceirizado. Tolice é se recusar a pôr na boca (com fins de deglutição, está
claro) qualquer coisa que fuja ao bifão com fritas ou ao sanduba com Coca.
Aventura é desencanar e provar, provar, provar, sabendo que o pior a acontecer,
desde que não haja alergias ou demais problemas de saúde conhecidos, é se
aturar determinado sabor por três minutos. Tolice é empacar na cisma de que um
amor jamais daria certo porque cor de cabelo ou preferência musical não
concordam com o que você tramou desde o início dos tempos. Aventura é amar e
acabou-se, se o essencial encaixa perfeitinho: ambos se respeitam, estimulam,
ensinam, aperfeiçoam. Ambos experimentam. Ambos cedem.
Tolice é
travar no modo “ganhar sempre”, cruel e impossível. Aventura é lidar de boas
com um ou outro perder de vez em quando, e aproveitar para dar uma crescidinha,
uma evoluidazinha, fazer uma descobertazinha no processo. Gente embebezada
chora de tudo sem proveito; tem de ser gente grande para poder chorar como quem
está se dando um jeito.
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