Leio com tristeza que a
pesquisa “Juventudes na escola, sentidos e buscas: por que frequentam?”,
realizada em vários estados brasileiros, levantou que quase 20% dos alunos de
escola pública (entre 15 e 29 anos) “não gostariam de ter um colega de classe
travesti, homossexual, transexual ou transgênero. O grupo só fica atrás de
bagunceiros (41,4%) e ‘puxa-saco’ dos professores (27,8%)”.
Entendo perfeitissimamente que não se queiram colegas furdunceiros – aqueles
que caotizam a sala, engolem a voz exasperada do professor, fazem o pobre
teacher se perder no planejamento e na explicação, cobrem tudo com seu manto
espírito de porco. Entendo igualmente que os lambedores de bota sejam
desprezados, porque donos de caráter flutuante, impreciso, com tendências a
xisnovear geral, plantar intriga e diferenciação. Nos dois casos (mais no
primeiro), há inconveniência e prejuízo reais trazidos pelo outro. Mas de onde
viria, Senhor, o dano de conviver em aula com gente de orientação sexual
distinta – ou em miúdos: de onde viria o problema coletivo a partir de uma
questão todinhamente individual?... A bizarrice é tanta quanto rejeitar
camaradas de olho azul, ou palmeirenses, ou que preferem amarelo. Freud não
explica, mas desconfia fortemente de que é um caso medieval de medo, apenas o
medo velho e mau.
Qualquer preconceito o
que é? medo, ora bolas. Receio, talvez, de não estar convicto da própria
sexualidade e ser suscetível a um “contágio” que lhe perturbaria mais a vida. Terror
de que a simples empatia se torne transferência de personalidade. Pânico de
ampliar horizontes, desacomodar preguiças, desassossegar o universo mental para
acolher individualidades que não tinham entrado na (sua) história. Aversão ao
aprendizado (mal de aluno que quer gastar caloria só com prova), nervoso de
mexer em dúvidas resvaladiças, vergonha de admitir que não somos capazes de
encaixotar e arquivar gente, horror ao julgamento burro de outras antas
preconceituosas (só um medíocre está à altura
de escorar um medíocre), fobia ao suor de pensar, compreender e – ai, minha
cabeça! – mudar. É triste, é desesperador que justamente um estudante, esse
gerúndio vivo, se recuse ao único verdadeiro ato de conhecer: conceber o ser ao
lado como humano umbilicalmente livre de nossa própria tabela, de nosso próprio
sistema. Atingir o fato de que pessoa não cabe em decoreba, não tem macete, não
tem fórmula – tem esforço de leitura, observação sincera, empenho e honestidade
de interpretação. Ser humano não é de exatas. Ser humano é de várias, é de
muitas, é de múltiplas, é de complexas.
Alunos amadíssimos: menos
memória resignada, mais melhora autêntica. Quem tem bitola não sai da escola.
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