O vídeo (promocional canadense) está correndo a internet: um grupo de crianças de 11,
12 anos joga basquete no quintal, a bola escapa, um dos meninos vai recolhê-la
e vê o vizinho cadeirante, mais ou menos da mesma idade, entrando em casa. Os
dois se olham, se cumprimentam e sorriem levemente – e um tanto tristemente, no
caso do garotinho que observa o outro com a bola na mão e não parece alimentar
expectativa de ser convidado. No entanto, depois que o vizinho se recolhe, o
pequeno jogador o segue visualmente; o sorriso já é novo: sorriso de ideia
fermentando. Corta para mais tarde. O jovem cadeirante descobre a mesma bola de
basquete sozinha, à sua porta; põe a cuja no colo e vai devolvê-la. Chega ao
quintal do jogo, se ilumina: toda a meninada lhe está colocada em rodas de
igualdade – um sentado em carrinho de jardim, outro em cadeira de escritório,
outro num caixote deslizante e criativos etcéteras. O menino que tinha
inventado as rodas agora lhe sorri um convite. Melhor não haveria.
Mais
fofura infantil? Toma fofura – e verídica. O mundo anda doido de paixão pelos
americaninhos Jax e Reddy, de cinco anos, que planejaram uma traquinice para
confundir a professora: Jax pediu à mãe que cortasse seu cabelo igualzito ao do
amigo, a fim de que a teacher simplesmente não conseguisse distingui-los. Teria
sido mesmo complicated para a Miss Something se não fosse pelo detalhe de Jax
ser branco e Reddy, negro. “Se isso não for prova de que ódio e preconceito são
ensinados, eu não sei o que é”, escreveu Lydia Stith, mãe do lourinho, ao
postar foto dos comparsas antes da ida à barbearia. “A única diferença que Jax
enxerga entre os dois é o cabelo.”
Estou
com Jax, Reddy e todas as crianças do vídeo: somos específicos na fórmula e
perfeitamente iguais na fundação. Somos aqueles papeizinhos de escolher salada
em alguns restaurantes; uns marcam cenoura, cebola, tomate e molho de iogurte,
outros cravam alface, palmito, batata palha e vinagrete, mas a mesma base, a
mesma lógica essencial nos compõe – a necessidade do amor eterna e inveterada. Nisso
somos gêmeos quase indistinguíveis, nessas veias e artérias do por-dentro,
nessa ossatura primordial da alma. Reconhecê-lo é ter olhos diretamente para o
importante; é quebrar a casca e ir à gema; é partir a crosta do bolo e ir ao
gosto; é tirar o brinquedo da caixa e ir à rua. Não é à toa que criança rompe
voraz a embalagem do presente: não tem ainda a delicadeza das minúcias, mas em
compensação tem a fome do âmago, do vital, do foco maior, e impaciência para
tudo o mais. E tudo o mais que é adjetivo, ornato e trique-trique se perde no
lixão ou se encaminha à reciclagem, restando só o substantivo em sua glória. Amigo.
Pessoa. Gente.
Bendito
o olho que raio-xiza a vida e busca direto a vontade alheia, blimundamente. Esse
só pousou na terra como impulso para o voo.
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