sexta-feira, 7 de junho de 2013

Gente feliz

Li no Face, algumas vezes, uma bem-humorada observância: “desejo que todos sejam felizes – gente feliz não enche o saco”. Fatão. Gente feliz mesmo (não daquela felicidade fajutamente de plástico, sempre ligada ao insucesso de outrem e, portanto, desvinculada da serenice de consciência que acompanha a Felicidade com efezão) se diverte e garante dentro da própria vida, sem por distração ou raiva amofinar a dos outros. Gente feli-li-liz – não apenas contente – fica até sem graça de causar qualquer perturbação, como se levasse vergonha de tanta felicidade estar desligada do mínimo de merecimento. Gente contentinha mora num estado de alegria vago e transitório, por isso mesmo invejoso de outras alegrias que supõe maiores ou mais firmes; gente feliz não ousa nem concebe invejas, bem ao contrário: tem nojo de manchar-se de ingratidão e, antes, convidaria todos os infelizes a lanchar no seu nirvana. Gente feliz automaticamente se sacraliza.

Gente feliz passou da temporada de provas; está com o coração assentado no sossego de sua própria casinha branca, dívidas morais quitadas, sem inadimplência emocional. Não há mal-resolvices de juventude ou infância entulhando e desperfumando o espaço. Não há velhas ansiedades corrompendo as relações de adrenalina inútil. Felicidade é a faxina grande de cada semestre, aquela de quando se cria bravura para encarar os cantinhos que viram tabus de bagunça e mofo. Felicidade tira a poeira das esquinas, evita o trauma alérgico das raivas não espanadas; é limpa, ensolarada, frontal, sem esqueletos, sem caixa-preta. Gente feliz já matou suas bruxas más e se tornou o castelo do final do desenho, novamente claro e florido, isento dos espinheiros que tornavam proibitiva a aproximação. Gente feliz não tem – ou não tem mais – os pensamentos de desperdão que eram sua sala intocável, medonha. Em consequência, não guarda mais necessidade de permanente defesa pela fofoca, cismância, impertinência desviadoras de foco. Gente que carrega felicidade legítima está indiferente ao ataque. Blindada. Excessivamente acostumada à continuidade de seu paraíso para se dar ao trabalho de procurar destruição no olho do outro. 

Gente já com derramado vício de venturança não perde mania de a colecionar.

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