Quando eu tinha seis anos... não, não ganhei um porquinho-da-índia, infelizmente – ou felizmente para o porquinho, que não morreu esmigalhado de fofura. Quando eu tinha seis anos, quando o mundo estava em 30 de junho de 1986, todos nós ganhamos um quitute doce, doce, doce para os cafés da manhã de segunda a sábado: estreava o Xou da Xuxa, berço de todas as lourices infantis na TV. Sim, antes já havia Xuxa e, consequentemente, já havia lourices; mas nada marcou mais uma geração do que aquela bizarrice colorida. Nave espacial, mosquito gigante (da época em que dengue ainda não era praga), tartaruga anã, querido Xuxo, aeróbica, ombreiras, botas, pompons, meninos contra meninas, não pode piscar, não pode rir, ilari-lari-lariê, pão, pão, pão, cartinhas, soldadinhas, smurfs, vai mandar beijo pra quem? She-Ra, He-Man, pra minha mãe, pro meu pai e pra você. Era desbundado, era insano. Era pura vida-é-mel.
Tive uma relação de amor e ódio com o Xou. Adorava invocar os poderes e a honra de Grayskull, mas me faltava paciência para o xuxismo: os beijinhos-beijinhos, a xaropada, o figurino, a histeria das tietes. Mãe me fez chuquinhas no cabelo em meia dúzia de festas e só. Também me irritava a mania de pôr garotos contra garotas (já então eu odiava as segregações, e, por sinal, achava os meninos ótimos companheiros de grupo na escola). Fora os desenhos do Xou – alguns –, o que eu curtia mesmo era Canta conto, Rá-Tim-Bum, as brincadeiras mambembes do Bozo, a simplicidade de Mãos mágicas. Este último programete, frugal toda a vida, eu esperava salivando: que desenho, recorte, colagem elas ensinarão hoje? Em compensação, sempre ganhei todos os discos da loura e sabia direitinho os hits principais, como quem bate ponto. No período em que havia música durante o recreio, meu encanto era pular a coreografia de “Tindolelê” pra lá e pra cá. Mais um! mais um!...
Mais um ano se passou, mais um, mais outro. De seis passei aos trinta e um anos, e o Xou, num certo 2011, completou suas bodas de prata com o Brasil. Tudo bem que eu quase não via, não gravava e (a ser sincera) não lastimei seu término. Não importa. Se a adultice traz algo de azul, é a gente ver tudo que nos trouxeram de azul. É reconhecer, nos gestos daqui da frente, as referências de lá de trás. Este post, devidamente, é a declaração de amor àquilo que não amei – da criança que no fundo sabe, amiguinha Xuxa, quanto era bom estar e brincar com você.
(P.S.: Se – ainda – quiser brincar com a gente, pode vir, nunca é demais!...)