Quem não viu, veja. Meia-noite em Paris, o mais recente Woody Allen, já é um dos filmes mais suculentos do ano. A enxurrada inicial de imagens da cidade (eu digo enxurrada mas é algo lento, mastigável, sem-pressamente francês) valeria a ida por si só, mas ainda estão lá: a gagueira do protagonista, a alegria de esbarrar com um Fitzgerald, um Hemingway ou um Picasso a cada esquina – e não falo aqui de suas obras –, a música de Cole Porter, a luz de Marion Cotillard, o casal republicano, o casal em crise, a festa com a Torre Eiffel ao fundo, o roteiro amanteigado, a suspensão total da descrença, a participação rinocerôntica de um Salvador Dalí (“Dalíííí!”) engolindo a cena na pele de Adrien Brody.... Não se sai senão satisfeito, tomado, embebido da capital francesa mas também de um olhar generoso sobre nossa própria moradia e época. Sai-se distribuindo je’taimes e ulalás.
Mas não vou repisar a tecla de que o filme mostra o quanto nos projetamos em outra era como se fosse o tempo ideal, a nossa Idade Ouro, em detrimento da fase histórica que nos foi dada (a felicidade “está sempre apenas onde a pomos,/ e nunca a pomos onde nós estamos”, diria Vicente de Carvalho). Está mais do que (bem) dito por todas as críticas, e o post de ontem não deixou de contemplar o assunto.
Quero, antes, mandar um beijo à personagem Gabrielle, um verdadeiro “J. Pinto Fernandes” no roteiro de Woody – aquela que, aparentemente, não tinha entrado na história. A discreta, tímida vendedora aparece pouco, mas bem. Não tanto por sua atuação, que nada tem de mirabolante, e sim pela delicadeza. A certa altura, a moça diz a Gil (papel de Owen Wilson), a quem só viu duas vezes como cliente, que se lembrou dele porque chegara à loja um novo disco de Cole Porter. O protagonista retruca que gostou de ser lembrado por esse motivo.
Quem não? Lembrados pelo que amamos, lembrados pelos pequenos interesses ou grandes paixões, lembrados pela aparência que temos por dentro – isso é o que todos esperamos ser, de preferência por quem supostamente não nos conhece, mas deu o passo mais certeiro neste sentido. Nem sempre teremos Paris como refúgio; porém, God allows, sempre teremos uma Gabrielle para nos hospedar gratuitamente na memória e compartilhar o gosto pela chuva. Bonne chance!
5 comentários:
Não assisti o filme, mas li a sinopse nesse final de semana e me interesse. É o tipo de filme que me prende, apesar de Woody Allen não fazer muito meu tipo de direção.
Vou tentar assistir.
Pela descrição iquei com vontade de assistir o filme.
Ai meu Deus, não acredito que vc escreveu sobre esse filme.
Estou louco de vontade de assistir!
A capa é maravilhosa.
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http://www.alteregodonuti.blogspot.com/
Fernanda,
Vc foi ao meu blog e me aconselhou a tirar um pouco da prosa de meus textos...
Como faço isso???
Pq eu somente escrevo o q sinto e gostaria de aprender com vc!!!
Seguindo vc viu???
Bjo
Karla
echidellanima.blogspot.com
Hm, esse filme tá dando o que falar.
Altas pessoas já me indicaram.
http://www.papel40kg.com/
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