quarta-feira, 29 de junho de 2011

Chave mestra

O poema preferido de minha irmã sempre foi a ode à fofura de Manuel Bandeira, o dulcíssimo “Porquinho-da-índia”: “Quando eu tinha seis anos/ Ganhei um porquinho-da-índia./ Que dor de coração me dava/ Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!” – e assim por diante, até a gente arrebentar de ternura. Apesar de amar o “Porquinho”, em termos de Bandeira eu tenho especial apego por outra guloseima, os versos de “Irene no céu”: “Irene preta/ Irene boa/ Irene sempre de bom humor.// Imagino Irene entrando no céu:/ – Licença, meu branco!/ E São Pedro, bonachão:/ – Entra, Irene. Você não precisa pedir licença”.

A figura de Irene, imagem de uma Tia Nastácia querida, materna, adorável, sempre me falou muito n’alma. Quero abraçar Irene, apertar-lhe as bochechas risonhas de ama-de-leite, cozinheira de perdições, contadora de histórias. Toda criança quer uma Irene. Por isso mesmo, nenhuma Irene pode ir senão para o céu, com honras de Estado.

Mas por que falo em irenes? Porque falo, na verdade, do sorriso que a recepciona. Hoje é dia do São Pedro bonachão de Manuel Bandeira, porteiro do paraíso, segundo a crença popular – o encarregado das boas-vindas aos recém-chegados. São Pedro, assim como Irene, é figura particularmente simpática; muito chão, muito gente. Exaltado, impulsivo, foi capaz das mais comoventes dedicações e de grandes tolices, foi peitudo e foi medroso como tantos de nós; foi todos nós, até achar seu lugar. Mais: foi abrir-nos lugar.

O que há de mais gostoso em São Pedro é justamente a missão de escancarar as portas. Seja por seus exemplos de amor às vezes desajeitado – mas sempre entusiástico –, seja pelo posto de promoter do céu. Somos todos irenes que lá chegam, porém fomos planejados para ser também pedros que recebem. Pedros que acolhem nos braços, que emprestam (aliás, doam) os ouvidos, que hospedam gratuitos, que orientam zelosos, que ensinam incansáveis. Pedros nunca exaustos de falar num sorriso – não importando nadíssima quem esteja do outro lado da linha:

– Entra, meu querido! Você não precisa pedir licença.

7 comentários:

Dona Ana disse...

Muito bonito, parabéns.

Paulão Fardadão Cheio de Bala disse...

Se for uma Irene escandalosa, qdo ri ou se assusta ou qqer coisa do gênero, é só colocar um S começo, q vira numa Sirene.

Guilherme Augusto disse...

Os sentimentos são as portas mais difíceis de serem abertas. Por isso devemos ter as chaves certas.

Lucas Moura disse...

Que texto lindo. Nunca mais tinha lido blogs, e retomei em grande estilo.
Todos nós somos irenes e pedros. O lado bom do ser humano necessita falar mais alto constantemente, tapando os ouvidos às maledicências e impropérios da vida.
Parabéns pelo blog.
visita o http://quaddronegro.blogspot.com/2011/06/ferias-finalmente-te-encontrei.html
Valeeu
Vou seguir aqui. Se vc gostar do que ver no blog, siga.Por favor.
Valeu
beijos

Anônimo disse...

Ótimo texto.
A temática e o estilo de escrita são muito interessantes.
Texto gostoso de ler, parabéns.

Unknown disse...

Hummm... Obrigado, entro sim...

>>O que há de mais gostoso em São Pedro é justamente a missão de escancarar as portas.<<

Fico imaginando milhões de sentidos diferentes para essa frase, cada uma em uma posição.

Mas o que será que o autor quis dizer com isso?

Gostei da sua postagem!

www.visaodemundogm.blogspot.com

Cultura e Donuts disse...

Olá querida. Te encontramos no orkut e viemos visitá-la! Gostamos muito do seu Blog, já estamos seguindo! Parabéns pelo teu trabalho :)
Retribui?
http://allstargt.blogspot.com

xoxoxoxoxoxo *-*