Todo mundo conhece as boas intenções que abarrotam o inferno. Mas sempre fico abestada com alguns novos exemplos. Soube que, nos Estados Unidos, tem pai e mãe comprando pela internet pirulitos – e otras cositas – contaminados com o vírus da catapora. Para quê? Adoecer os filhos. Você leu certo: adoecer os filhos. De propósito. E não falo aqui daquelas aberrações da natureza que cometem crimes estapafúrdios, escondem o corpo das crianças no porão e depois aparecem num episódio do Lei & ordem. Falo de gente teoricamente sã, pai e mãe extremosos, extremosíssimos. Tão dedicados que resolveram contaminar os rebentos para vaciná-los naturalmente, torná-los imunes às bolhas cocentas da varicela o mais rápido possível. Tem mais: organizam “festas da catapora”. Isso mesmo que você pensou, com ar incrédulo. Misturam coleguinhas com e sem a doença para inocular geral. Sai todo mundo devidamente cataporizado, com o aval das respectivas famílias. Extremosíssimas.
Considero-me pessoa razoavelmente prática, sem quase paciência para burocracias, enfeitações de pavão e lero-leros. E sou zero-porcentomente maternal. Mesmo assim, engasguei cinco ou dez vezes ao ler a notícia. Arregalei-me. Então existe, gente? existe? quem na caradura, com pureza d’alma e convicção de estar tendo mó gesto de amor, entregue a seu filho um doce lambido, um lenço espirrado, um sei-lá-quê babado por criança desconhecida e doente – um sei-lá-quê comprado na rede, de sei-lá-quem? O governo, claro, pirou com esse descalabro e ameaçou punição aos doidos. Lembrando que – como se já não fosse insano o bastante enfiar uma catapora goela abaixo – podem vir outros vírus, bactérias outras, nessas pecinhas e docinhos comprados por amor. Pode vir coisa pronta para devorar pequenas vidas entregues (coitadas) aos “cuidados” de quem foi escalado para preservá-las.
Vai longe nossa brincadeirinha de deuses. Nosso gozo sádico, louco, de esfregar males nos outros em nome de um alegado bem. Nosso impulso de esbofetear com verdades sem anestesia (de preferência, em público). Nosso gosto de dedurar em prol da suposta moral, torturar em prol da suposta ordem. Nossa petulância de bater para educar, de ferir para curar, de disfarçar nossa crueldade vingativa sob a legitimação dos “bons objetivos”.
O que nos irrita são as naturais demoras, os tempos necessários, orgânicos, para que fatos e consequências se concretizem. O que nos mata é não decidir. Sermos inúteis para resolver com nossos cetros. Em nossas pressas de seres da Inquisição, não perdoamos a lentidão das cataporas. A arrogância da história que teima em desobedecer a nossos decretos reais. O absurdo de micro-organismos não se curvarem a nossas decisões de pais – extremosíssimos. Aí enfraquece.
Aí essa gente nos obriga a fazer injustiça com as próprias mãos.
Considero-me pessoa razoavelmente prática, sem quase paciência para burocracias, enfeitações de pavão e lero-leros. E sou zero-porcentomente maternal. Mesmo assim, engasguei cinco ou dez vezes ao ler a notícia. Arregalei-me. Então existe, gente? existe? quem na caradura, com pureza d’alma e convicção de estar tendo mó gesto de amor, entregue a seu filho um doce lambido, um lenço espirrado, um sei-lá-quê babado por criança desconhecida e doente – um sei-lá-quê comprado na rede, de sei-lá-quem? O governo, claro, pirou com esse descalabro e ameaçou punição aos doidos. Lembrando que – como se já não fosse insano o bastante enfiar uma catapora goela abaixo – podem vir outros vírus, bactérias outras, nessas pecinhas e docinhos comprados por amor. Pode vir coisa pronta para devorar pequenas vidas entregues (coitadas) aos “cuidados” de quem foi escalado para preservá-las.
Vai longe nossa brincadeirinha de deuses. Nosso gozo sádico, louco, de esfregar males nos outros em nome de um alegado bem. Nosso impulso de esbofetear com verdades sem anestesia (de preferência, em público). Nosso gosto de dedurar em prol da suposta moral, torturar em prol da suposta ordem. Nossa petulância de bater para educar, de ferir para curar, de disfarçar nossa crueldade vingativa sob a legitimação dos “bons objetivos”.
O que nos irrita são as naturais demoras, os tempos necessários, orgânicos, para que fatos e consequências se concretizem. O que nos mata é não decidir. Sermos inúteis para resolver com nossos cetros. Em nossas pressas de seres da Inquisição, não perdoamos a lentidão das cataporas. A arrogância da história que teima em desobedecer a nossos decretos reais. O absurdo de micro-organismos não se curvarem a nossas decisões de pais – extremosíssimos. Aí enfraquece.
Aí essa gente nos obriga a fazer injustiça com as próprias mãos.
3 comentários:
Meu Deus!!! não sei se estou boqueaberta pelo conteúdo do texto ou por seu talento para leitura e escrita do mundo...Disse tudo querida!!
É sempre uma agradável surpresa visitar teu blog,show! Beijos.
comprando pela internet pirulo ;s
ótimo post. SEGUINDO
sou novo com essa coisa de blog, um comentario seu, poderá fazer uma diferença.
http://baakerbar.blogspot.com/
A Barbarie tem rosto Humano. Tem que ser muito neurotico para se fazer uma coisa desta com seu proprio filho, é lamentavel mais a vida nos reserva estas atrocidades.
http://paulosergioembuscadotempoperdido.blogspot.com/
Postar um comentário