Satisfeitamente, leio na coluna de Hermano Vianna a criação do brasileiríssimo Ginga, “programa de computador [...] que, assim espero, vai gerenciar as funções interativas da TV digital no Brasil e em várias outras partes do mundo”. Orgulho! Peninha que nem todos compartilhem a impressão. Na mesma coluna, Hermano relata o ocorrido quando Luiz Fernando Gomes Soares (um “dos principais pais do Ginga”) foi defender o programa em Brasília: “ouviu de um parlamentar que o Brasil deveria se preocupar é com exportação de frangos e laranjas”.
Pasmei. Anos e anos e anos, décadas e décadas e décadas tentando arrancar de nossa terrinha a pecha das roupas floridas, das onças na rua, do samba descontrolado, dos abacaxis na cabeça, da colônia resignada a exportar café, açúcar, borracha, do solo que só existe para ser doador universal de gêneros alimentícios e mineralícios, do submundo ignorante a ser mastigado e cuspido por espertões de EuropEUA – vêm criaturas aqui nascidas e criadas, pleno século XXI, selar convictas o rótulo de República das Bananas (ou Solar das Laranjas) que sempre nos deram? Então é isso? acabou? É isso mesmo que somos, que fomos, que seremos ad aeternum – a pátria bonitinha e ordinária, a donzela que não precisa estudar porque nasceu linda, a moçoila que deve se dar por feliz de ter marido para quem passar, lavar e esfregar o chão da cozinha?
Não sei vocês; eu, particularmente, sempre tive gana de reducionismos. Sempre tive mais que horror: beira de vômito dessas plaquinhas que colam na gente ao longo da vida, por facilidade de identificação, sei, mas basicamente por preguiça de ultrapassar a linha amarela do óbvio. Já tão pequena, odeio ser miniaturizada. Reduzida a uma foto que nos tiraram num instante perdidíssimo da existência, deixado sei lá onde, nem lembramos mais que um dia fomos ou fizemos. Mas os outros lembram. Ah, lembram. Tanto lembram que só lembram disso, e eis você anexado nessa bendita imagem pausada a vida inteira, como aquela luz de estrela que só chega à Terra com delay. Séculos passam, a estrela morreu e a luz está lá. Nós: morremos para tantas coisas no decorrer das idades, e ainda assim parecemos continuar emitindo o flash anacrônico, a radiação específica que tínhamos aos cinco anitos.
Aos cinco anitos, quase fui esmagada atrás da porta pela mãe de uma colega, porque tive pudor excessivo de acusar minha presença. Continuo sofrendo para criar casos, mas, definitivamente, não me deixo esmagar. Digo os sins possíveis e TODOS os nãos necessários. Minha mãe, porém, creio que ainda me acha capaz de ter um ou dois ossos quebrados por pura vergonha. Quando finalmente a angústia escapa, e grito e choro como qualquer mortal de sangue nas veias, aí ela encontrou a etiqueta perfeita: estou dando show. Sendo teatral. A consequência natural qual é? Engolimos toda e qualquer verdade de nós mesmos perto dos que nos miniaturizam, e levamos a autenticidade para passear diante dos que não têm a vista cansada do hábito, a desculpa da intimidade. Vamos ser mais reais com aqueles para quem somos estreia. Espetáculo sem prévias críticas. Como um Brasil que vai ser mais brasileiro fugindo ao olhar brasileiro e ganhando reconhecimento no exterior: selo de qualidade para convencer a própria terra.
Pasmei. Anos e anos e anos, décadas e décadas e décadas tentando arrancar de nossa terrinha a pecha das roupas floridas, das onças na rua, do samba descontrolado, dos abacaxis na cabeça, da colônia resignada a exportar café, açúcar, borracha, do solo que só existe para ser doador universal de gêneros alimentícios e mineralícios, do submundo ignorante a ser mastigado e cuspido por espertões de EuropEUA – vêm criaturas aqui nascidas e criadas, pleno século XXI, selar convictas o rótulo de República das Bananas (ou Solar das Laranjas) que sempre nos deram? Então é isso? acabou? É isso mesmo que somos, que fomos, que seremos ad aeternum – a pátria bonitinha e ordinária, a donzela que não precisa estudar porque nasceu linda, a moçoila que deve se dar por feliz de ter marido para quem passar, lavar e esfregar o chão da cozinha?
Não sei vocês; eu, particularmente, sempre tive gana de reducionismos. Sempre tive mais que horror: beira de vômito dessas plaquinhas que colam na gente ao longo da vida, por facilidade de identificação, sei, mas basicamente por preguiça de ultrapassar a linha amarela do óbvio. Já tão pequena, odeio ser miniaturizada. Reduzida a uma foto que nos tiraram num instante perdidíssimo da existência, deixado sei lá onde, nem lembramos mais que um dia fomos ou fizemos. Mas os outros lembram. Ah, lembram. Tanto lembram que só lembram disso, e eis você anexado nessa bendita imagem pausada a vida inteira, como aquela luz de estrela que só chega à Terra com delay. Séculos passam, a estrela morreu e a luz está lá. Nós: morremos para tantas coisas no decorrer das idades, e ainda assim parecemos continuar emitindo o flash anacrônico, a radiação específica que tínhamos aos cinco anitos.
Aos cinco anitos, quase fui esmagada atrás da porta pela mãe de uma colega, porque tive pudor excessivo de acusar minha presença. Continuo sofrendo para criar casos, mas, definitivamente, não me deixo esmagar. Digo os sins possíveis e TODOS os nãos necessários. Minha mãe, porém, creio que ainda me acha capaz de ter um ou dois ossos quebrados por pura vergonha. Quando finalmente a angústia escapa, e grito e choro como qualquer mortal de sangue nas veias, aí ela encontrou a etiqueta perfeita: estou dando show. Sendo teatral. A consequência natural qual é? Engolimos toda e qualquer verdade de nós mesmos perto dos que nos miniaturizam, e levamos a autenticidade para passear diante dos que não têm a vista cansada do hábito, a desculpa da intimidade. Vamos ser mais reais com aqueles para quem somos estreia. Espetáculo sem prévias críticas. Como um Brasil que vai ser mais brasileiro fugindo ao olhar brasileiro e ganhando reconhecimento no exterior: selo de qualidade para convencer a própria terra.
Santo de casa miniaturiza para nos guardar. Voamos. Nossa evolução intrínseca não cabe muito tempo na prateleira dos colecionáveis.
4 comentários:
Deus do céu, que texto é esse!
Realmente, Solar das Laranjas foi ótimo!
Essa é a tendência, miniaturizar todo mundo pq fica mais fácil comandar!
http://alteregodonuti.blogspot.com/
?!?
Oi Fernanda;
Vim aqui agradecer ao seu comentario no nosso blog e dizer q o seu blog tbm tem textos belissimos e sua inteligencia é algo q faz a gente ler com prazer.
Parabéns!
Abraços
Renata
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