sexta-feira, 29 de julho de 2011

Meu bem, meu mal

Quem não retornou hoje de uma expedição de nove meses à Sibéria sabe que Leonardo (personagem de Gabriel Braga Nunes), um dos vilõezões da novela das 21h, aprontou muitas e más com o irmão Pedro (Eriberto Leão), a cunhada e ex-mulher Marina (Paola Oliveira) e a atual carrasca Norma (Glória Pires). Pois a atual carrasca, que o cria em cativeiro como seu BBB particular, ainda é louquinha pelo pulha. Marina sacou tudo. No finzito do capítulo de ontem, apareceu toda linda na casa de Norma e informou que vinha avisá-la a respeito de Léo. Mas não vinha chover no molhado e listar, como tantos, os defeitos do psicopata. “Quero alertá-la sobre as qualidades dele”, esclareceu a mocinha, descrevendo como o olhar verde e tímido, ao mesmo tempo impetuoso, era capaz de demolir barreiras. Fora a lábia de escroque, o “bico doce” de malandro. Nenhuma novidade para a carrascona, já em vésperas de cair de novo na esparrela do infeliz – depois de ter descido por ele ao Hades, sem parada no duty free.

Taí o nosso problema. Não o nosso problema como Normas, mas como Léos. Temos ruins virtudes, temos olhares de Medusa, temos cantos de sereia. Um bocadim a mais de esforço e conseguimos cortar poderes, transformar Sansões guerreiros em Sansões coelhinhos de pelúcia. Intuímos a coisa desde o berço: quanto mais fofinhos, rosadinhos, rechonchudos, mais garantidos nos descobrimos em artes de manipulação. Bochechas manhosas se tornam o doce ganho antes do almoço. Covinhas irresistíveis viram permissões indevidas. Vozes de locutor de rádio – ou de locutora de aeroporto – persuadem a menores e maiores falcatruas. Sorrisos colgáticos fazem esquecer a tarifa do cartão. Notas dez consecutivas convencem o professor a perdoar a cola só desta vez. Ternos bem cortados, vestidos da última coleção assaltam sem tanta resistência. Carismas e bons históricos roubam em cadeia nacional. Oratórias e antecedentes irretocáveis metem a mão em escala planetária. Mas ele não fez, ela não faz por mal.

Fazemos por mal. Tanto mais por mal quanto mais abduzimos nosso suposto bem. Nada mais covarde que tomar sua literatura, sua enofilia, sua cosmopolitice como escudo para seu Hannibal Lecter. Vá, não queremos mastigar o nariz de ninguém. A gente podia estar matando, a gente podia estar roubando, a gente podia estar sendo psicopata mundo afora. Desculpa porca. Só no tempo em que você flertou para furar a fila, trouxe brinquedo para compensar a falta, beijou para acobertar a traição, assassinou umas oito fadas.

O que a gente tem de tempestade está na cara. É nas horas ensolaradas que tem de ter plaquinha. Pra ninguém se aproximar sem guarda-chuva.

7 comentários:

Marcos disse...

Adorei o artigo e o blog no geral!
Você está de parabéns

Aline disse...

Pq no final das contas, todo mundo tem um lado vilão...

Fernando disse...

Estamos rodeados em todos os lugares por gente assim, e por que não dizer muitas vezes nós mesmos é quem abrigamos um louco, um vilão, um psicopata, sociopata dentro de nós mesmo.
É preciso muita astúcia pra não nos enganarmos com esses sorrisos doces, olhares tímidos e atitudes meigas.

carol disse...

Incrível! ÓTIMA reflexão! Bom pra pensar...
bjs

Nubia Santos disse...

Fernanda , pega o desafio lá no meu blog e participe !


http://eupossofazeradiferenca.blogspot.com/2011/07/desafio.html

Bjs

Nelson disse...

Olá, Fernanda! Obrigado pela presença em meu blog "Literatura e Linguagens". Suas palavras...algo repleto de essência e conteúdo, isto diz quase tudo... Parabéns pelo seu belo espaço! Desejo-lhe sucesso e prosperidade, amiga. Sou seu seguidor, tá? "Beijos literários"!

Unknown disse...

acabei de ler o "elogio à madrata" do mario vargas llosa, onte o antagonista da história é a personificaçao do mal em forma de anjo. seduz a tudo e a todos com olhos azuis, cachos dourados e suposta inocencia infantil...

e quantas vezes nos deixamos seduzir por esses personagens novelescos da vida real....