Brasileiro não examina: dá uma olhada. Aliás, uma olhadinha. Brasileiro não visita, dá uma passada. Não se diverte, dá uma espairecida. Não observa, dá um confere. Não passeia, dá um rolé. Não se bronzeia, pega um solzinho. Não surfa, pega uma onda. Não aborda, chega junto. Não entretém, faz sala. Não encontra, faz social. Não resolverá: quer resolver. Não ligará: pretende ligar. Não gosta: costuma gostar. Serve cafezinho, manda beijinho, dá tchauzinho, pede dois minutinhos. Transforma toda objetividade crua em afirmação indireta, todo verbo rápido em locução demorada; iguala todo pedido ou ordem, toda mostra de fraqueza ou força no mesmo diminutivo. Nossa língua nos mimetiza. Não enfrenta nem atravessa: contorna.
Nunca nos jogamos inteiros na frase, como nunca no país; nos entregamos de meio-corpo. Deixamos sempre uma rota de fuga (vai que). Até em questões de idioma, fugimos ao compromisso do permanente. Atenuamos. Amenizamos. Relativizamos as declarações tanto quanto aos problemas. Estamos um bocadinho cansados, um pouco preocupados, ligeiramente apavorados, mais ou menos apreensivos; estamos, tipo, exaustos. Meio que não dormimos bem, meio que devemos uma fortuna no cartão, meio que fomos despedidos. Ainda não ouvi, mas ouvirei alguém se dizer “meio que grávida”.
Não admira o gerundismo de telemarketing ter alcançado tanto sucesso por estas bandas. A almofada perfeita. Um “vou estar transferindo”, “vamos estar cobrando”, “íamos estar cancelando” maleável, suave, acolchoado, em lugar do “transferirei”, “cobraremos”, “cancelaríamos” e sua agressividade de adaga. Malandros, dribladores, amamos a curva e tememos a reta. O verbo liso, o substantivo nu nos ofendem. A burocracia nos salva da eficácia. O talvez nos salva da regra. O quem-sabe nos salva da lei. Sins e nãos, olha que perigo: são lavrados na rocha, reconhecidos em cartório, não vêm com saída de incêndio. Desviamo-nos ao contrato, esgueiramo-nos por baixo da porta, embalamos a realidade em palavras de plástico-bolha. Herdeiros dos salamaleques promíscuos com a família real, nós – principalmente nós cariocas – não queremos ferir suscetibilidades. Louvamos o chegar-junto no macio, não queremos melindrar. Queremos seduzir, sondar, serpentear, farejar a presa na diagonal, sem derramamento de sangue. Safadamente infantis, fazemos da língua um Cavaleiro do Zodíaco: o que morre não morre direito, renasce, remorre, torna a renascer e remorrer de acordo com as melhores conveniências. Tudo menos o definitivo. Tudo menos a definição. O Brasil é um país provisório.
(Tipo assim.)
15 comentários:
Nossa, parabens voce escreve muuuuito bem, muito bom seu texto , o modo como colocou os brasileiros. Um texto de verdade.
Uma verdade mto bem dita. Me impressiona cada dia mais a forma como escreve! Parabéns Fernanda.. tô adorando seus textos.
Beijos.. =**
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gostei muito do texto
parabens
verdade seja dita
kkkkkkk
^^
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Muito delicinha seus posts
Parabéns.
Fernanda, gostei muito das suas reflexões sobre o país que faz questão, de ser um... lugarzito,como o nome do seu blog, nas cosias mais simples, mandou muito bem e é bom saber que eu não sou a única desconfortável com isto, no mundo dos blogs rsrsrs. bjão.
Parabens pelo texto. Muito bom.
Brasileiro é assim preguisoço até o ultimo, muito bom o texto XD. A burocracia acaba com muita coisa nessa joça de pais
Adorei a expressão "brasileiro não praticante"! Tb me encaixo nessa! Ah, e ótimo texto, parabéns!
http://loversmusica.blogspot.com/
Excelente post , nosso país é o país do "quase" hehehe
http://andyantunes.blogspot.com/
Como disse Renato Russo: "O Brasil é o país do futuro..."
E um futura bem distante, esse.
Entra e sai governo e pobres mais pobres, as escolas sucateadas, a saude precária.
Espero um dia ver o Brasil do presente.
http://atras-dos-olhos.blogspot.com/
Concordo com o que você escreveu no post. E também com os comentários. "O nosso país é um país do 'quase'". rs
kkkk ficou bem divertido!
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Brasileiro é assim mesmo kkkk gostei muito parabens e concordo somos um pais provisorio
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