
Tomemos a pomba, a propósito. Só pela alvura é que foi promovida a símbolo da paz? É de crer que não. Se o leitor conhece a saga de Noé, lembrará que o patriarca enviou o bichinho para sondar a quantas andava a Terra no pós-dilúvio. Eis que, em belo dia, volta um ramo verde no bico do mensageiro. O sinal esperado: há vida após a catástrofe, há o que curtir e colher mesmo no território mais apodrecido de má chuva. É provável que a penugem não tenha passado incólume ao barro excessivo, que tenha mais ou menos emporcalhado a brancura simbólica. Não importa. Embaixadores da paz não ligam para sujeiras laváveis, provisórias, que maculam fora sem ferir dentro. Vão direto ao assunto: vasculhar o tesouro, garimpar a riqueza, chafurdar até a última renúncia necessária para não se reacomodar na programação normal sem a medalha de um raminho verde.
Embaixadores da paz não aceitam lama como resposta. Chateiam, insistem, escarafuncham, mergulham cegos na crença de uma vida que não veem, polianamente enxergando o essencial sob a casca (às vezes nojenta). Médicos que se recusam a desenganar, diplomatas que se dispõem a ouvir, voluntários que teimam em oferecer, vítimas que se negam a julgar, eleitores que resistem a anular, revoltosos que não concebem destruir. Gente que não acata como decreto a impressão ruim, que não se afeiçoa aos próprios maus impulsos. Gente que não cede a si mesma.
Hoje (em cada “hoje”), sejamos menos o que desejamos e mais o que pretendemos. Questionemos instintos, indisponibilidades e nãos. Questionemos preguiças e vontades. Paz não se faz com vontade: faz-se com a decisão que gentilmente a supera. Começa na bandeira branca; termina, muito melhor, na bandeira rasgada e enlameada de quem preferiu abandonar-se a abandonar a paixão de sua ideia, sua fé, seu gol, sua convicção, sua finalidade, sua esperança, sua espera – sua amostra de vida, sua ponta de iceberg, sua prova de vitória, sua resposta.
Verde.
4 comentários:
Jamey Rodemeyer tinha 14 anos. Na manhã da última segunda-feira, seus pais o encontraram morto. O garoto faleceu em decorrência de um suicídio.
Mas, diariamente, ele era crucificado simplesmente por ser como era.
Descanse em paz verdadeira, Jamey. A paz que vivemos aqui na Terra é falsa.
Interessante o post, mais .. que a adianta enquanto alguns quer paz, outros por que foi ultrapassado no trânsito ou por que houve um arranhão desce.. e mata pai de família aonde tudo pode ser conversado.
infelizmente o povo ta com raiva
Sim... mas às vezes, pra que funcione, temos de ser viscerais. Falar a língua em que as pessoas prestem atenção, e nem sempre é a nossa. Abs!
Para alcançarmos a paz precisamos sair dos vícios para as virtudes. É isso que o evangelho ensina.
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