Numa sua crônica que é como mel de laranjeira pros olhos, Rachel de Queiroz cita o que seria o “real desejo de seu coração”. A saber: mandar o mundo se danar com todos os respectivos conteúdos. Mandar amor, público, pátria, dinheiro, parentela se danarem, enquanto ela mesma, faceira, se deita na rede saboreando castanhas e romances de Agatha Christie. Porém – esclarece logo a autora na segunda parte do texto, chamado “Talvez o último desejo” – isso era coisa que afinal não faria. Porque “o miserável coração nasceu cativo e só no cativeiro pode viver. O que ele deseja é mesmo servidão e intranquilidade: quer reverenciar, quer ajudar, que vigiar, quer se romper todo. Tem que espreitar os desejos do amado, e lhe fazer as quatro vontades, e atormentá-lo com cuidados e bendizer os seus caprichos; e dessa submissão e cegueira tira a sua única felicidade”.
Dona Rachel está certa, está muito certa, está certíssima. A não ser em caso de sociopatia aguda, o coração não manda ninguém se danar porque se encarrega de danar-se sozinho. O coração quer precisar; quer morrer mil vezes por hora como experiência de vida. O coração faz questão das pequenas ansiedades como prova de caráter e das grandes agonias como carimbo de existência. O coração quer fazer-se adulto sangrando lágrimas de travesseiro, por causa do perdão não pedido ou telefone não tocado; quer fazer-se criança para mais devidamente sofrer o envelhecimento dos pais; quer fazer criança para – na falta ou na dúvida de outros amores bem violentos – garantir um ultimate love que o desespere de preocupações até que a morte os separe. E a morte não os separa, porque o coração, óbvio, arranja saudade para retorcer-se. Coração, uma vez nascido, não fica offline de suas duras penas.
Mas ao coração não há duras penas. Há tantas alegrias no ato de ficar procurando de que maneira derramar-se, há tantas compensações na obra, que o sacrifício, mesmo, seria se exilar da dor num canteiro de ócio. Coração precisa exercitar os músculos. As pernas. O engenho. Precisa correr toda a Rua da Alfândega atrás de lembrancinhas para os alunos ingratos e acampar dois dias na fila porque a caçula morre sem ingressos pro Justin Bieber. Precisa descobrir, à força, o tom de azul favorito do peguete e vesti-lo na festa de aniversário, como quem não quer nada – quer tudo. Precisa fazer curso de dança do ventre para incrementar de encantos a relação nunca desencantada. Precisa aprender a receita da iguaria russa, de família, que o noivo provou em férias de infância e levou pro resto dos dias como ícone de felicidade. Precisa organizar passeata, precisa ter AVCs emocionais com notícia do RJ-TV e denúncia do Fantástico, precisa chorar nem que seja em novela, precisa se importar nem que seja com o casal do seriado. Precisa torcer nem que seja por um confinado, e dedicar-se nem que seja a votar votar votar votar pela saída do outro participante. Precisa ser participante com seus adequados hematomas e necessários arranhões, mesmo que depois se afogue no Gelol. Coração pode ser milionário no banco, mas carece trabalhar pra ser gente. Coração não vive de rede ou de renda. É tubarão que para de respirar sem movimento. Congela. Embota. Embolota. Embolora.
Deixar de existir é muito perigoso.
Dona Rachel está certa, está muito certa, está certíssima. A não ser em caso de sociopatia aguda, o coração não manda ninguém se danar porque se encarrega de danar-se sozinho. O coração quer precisar; quer morrer mil vezes por hora como experiência de vida. O coração faz questão das pequenas ansiedades como prova de caráter e das grandes agonias como carimbo de existência. O coração quer fazer-se adulto sangrando lágrimas de travesseiro, por causa do perdão não pedido ou telefone não tocado; quer fazer-se criança para mais devidamente sofrer o envelhecimento dos pais; quer fazer criança para – na falta ou na dúvida de outros amores bem violentos – garantir um ultimate love que o desespere de preocupações até que a morte os separe. E a morte não os separa, porque o coração, óbvio, arranja saudade para retorcer-se. Coração, uma vez nascido, não fica offline de suas duras penas.
Mas ao coração não há duras penas. Há tantas alegrias no ato de ficar procurando de que maneira derramar-se, há tantas compensações na obra, que o sacrifício, mesmo, seria se exilar da dor num canteiro de ócio. Coração precisa exercitar os músculos. As pernas. O engenho. Precisa correr toda a Rua da Alfândega atrás de lembrancinhas para os alunos ingratos e acampar dois dias na fila porque a caçula morre sem ingressos pro Justin Bieber. Precisa descobrir, à força, o tom de azul favorito do peguete e vesti-lo na festa de aniversário, como quem não quer nada – quer tudo. Precisa fazer curso de dança do ventre para incrementar de encantos a relação nunca desencantada. Precisa aprender a receita da iguaria russa, de família, que o noivo provou em férias de infância e levou pro resto dos dias como ícone de felicidade. Precisa organizar passeata, precisa ter AVCs emocionais com notícia do RJ-TV e denúncia do Fantástico, precisa chorar nem que seja em novela, precisa se importar nem que seja com o casal do seriado. Precisa torcer nem que seja por um confinado, e dedicar-se nem que seja a votar votar votar votar pela saída do outro participante. Precisa ser participante com seus adequados hematomas e necessários arranhões, mesmo que depois se afogue no Gelol. Coração pode ser milionário no banco, mas carece trabalhar pra ser gente. Coração não vive de rede ou de renda. É tubarão que para de respirar sem movimento. Congela. Embota. Embolota. Embolora.
Deixar de existir é muito perigoso.
2 comentários:
Muito bom seu blog e suas postagens!
Este texto combino cmg hehe .
Muito bom msm!
Q texto show de bola !!
Ri varias vezess!!! Gosteeei mt !
Abraaaaços!
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