
Ai de nós, de nossos sons e nossas fúrias, se não houvesse o teatro. Se não houvesse espelho tão escrachado e carne-vivo de nossas rudezas – mais dedo-na-ferida do que cinema e TV, já que teatro não admite fugas. Teatro é você na base do corpo a corpo com o ator; é você soterrado pelo texto, pelo gesto, pelas caras e bocas, pelas tragédias e comédias que lhe desabam na cabeça sem o coração fazer pausa de cafezinho, pipoca, banheiro, celular. Se saímos da plateia? saímos, quando a necessidade é maior que o medo de chamarmos atenção indevida do elenco, e de sermos depenados por ele em vez de o depenarmos. Nossos pudores mínimos, porém, desencorajam a aventura, e nos submetemos à orgia de máscaras coletivas para não termos as individualidades desmascaradas. Teatro é opção entre esses dois estupros autorizados. Teatro nos exige ou zomba de nós, ou nos tem ou nos rejeita, ou nos possui ou nos denuncia. Teatro é psicologia em imersão total, é divã hardcore. Teatro é dá ou desce.
Neste 21 de março Universal do Teatro, sente-se à plateia com olhos de perna quebrada, postura vergada, vaidade caída, à disposição do que lhe venha expurgar os (des)conhecimentos tão sólidos e as humanas tolices tão incontestáveis. Que Shakespeares e Brechts lhe deem uma boa hora no parto deste novo ser (ou não ser) que nos brota inevitavelmente em cada peça. Merde pra você.
Um comentário:
Muito bom!
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