Quer ver me irritar no Dia Internacional da Mulher? Só fazer reportagem sobre presença de mulher no mercado de trabalho. Em 2012, isso equivale a – sei lá – falar com espanto da eletricidade em 1951, assombrar-se com a existência da televisão em 1995. Ainda anteontem surgiu a internet; no dia seguinte, o homem fez clonagem e mapeou o genoma; e ninguém trata com mínimo susto o fato de podermos estar online dentro de um cinema, ou de termos um cachorrito com DNA idêntico ao do pet falecido. Normal. Assim caminha a humanidade. Mas basta chegar o 8 de março e a xaropada recomeça: a mulher executiva, a mulher motorista de ônibus, a mulher piloto de avião, a mulher advogada, a mulher cardiologista, a mulher engenheira, a mulher zagueira. Que lindo – e que velho. Mais velho que a internet, que o genoma adestrado, que o celular, que a pesca de células-tronco. Velho como a obviedade, óbvio como a conquista do fogo, natural como o uso da roda. Estamos bonitinhas no mercado de trabalho, e daí? Onde, cargas d’água, estaríamos nós?...
Longíssimo de me homenagearem, as repetições basbaques em torno do tema – com direito a sorrisos condescendentes dos apresentadores, ui, raiva! – me botam ruguinhas de má perspectiva. Mau panorama. Se ainda é espantosa novidade a mulher trabalhar fora, sustentar a casa, ter carreira bem-sucedida no que mais lhe agradar; se ainda é imensa novidade o evidente dos evidentes, o básico dos básicos – quando então partiremos para as evoluções periféricas? Quando a mulher que (oh!) ocupa as mesmas funções masculinas terá o mesmíssimo salário masculino? Quando a mulher namoradeira deixará de ser “vadia”? Quando a mulher virgem deixará de ser “atrasada”? Quando a solteira deixará de ser “solteirona”? e quando perderá para sempre o “encalhada”? Quando a casada esquecerá o que são tias (primas, colegas) cobrando maternidade? Quando a mãe sairá para o (oh!) emprego sem culpa de imperfeição? Quando a imperfeição se divorciará da pecha de hormônios em desordem, de falta de sexo, de TPM? Quando a mulher – também aos olhos da mulher – passará do assombro da exceção à serenidade da regra?
No mesmo dia em que nos limitarmos a ver aglomerados de carne expostos no açougue, não em capas de jornais populares (socados em biquínis de 3 mm). Na mesma data em que senhoritas de apelidos hortifrutigranjeiros se tornarem lenda urbana ou heroínas de HQ. Na mesma ocasião em que abandonarmos o posto de gênero alimentício – consumíveis por natureza: no calendário do ano, na revista do mês, na baladinha da noite. No mesmo instante em que a mulher não for mais “pega”, “comida”, tomada, apassivada, puxada pelo cabelo na boate, sequestrada como sabina pelo fato de ser “delícia” ou “filé” exibido na vitrine, à espera do braço forte que lhe arranque roupas e problemas.
Quando for inconcebível que um dia possa não ser Internacional da Mulher; quando for absurdo reservar um vagão feminino no trem ou metrô, tendo-se qualquer assédio por impensável em algum dos outros; quando for obsoleto celebrar a preponderância da chefe, da vice, da presidente; quando o 8 de março aparecer empoeirado num calendário todo feito de batons e rosas – estaremos finalmente no ponto. Continuamos vergonhosamente crus enquanto o ato de pertencer a uma das metades da humanidade ainda é notícia.
Longíssimo de me homenagearem, as repetições basbaques em torno do tema – com direito a sorrisos condescendentes dos apresentadores, ui, raiva! – me botam ruguinhas de má perspectiva. Mau panorama. Se ainda é espantosa novidade a mulher trabalhar fora, sustentar a casa, ter carreira bem-sucedida no que mais lhe agradar; se ainda é imensa novidade o evidente dos evidentes, o básico dos básicos – quando então partiremos para as evoluções periféricas? Quando a mulher que (oh!) ocupa as mesmas funções masculinas terá o mesmíssimo salário masculino? Quando a mulher namoradeira deixará de ser “vadia”? Quando a mulher virgem deixará de ser “atrasada”? Quando a solteira deixará de ser “solteirona”? e quando perderá para sempre o “encalhada”? Quando a casada esquecerá o que são tias (primas, colegas) cobrando maternidade? Quando a mãe sairá para o (oh!) emprego sem culpa de imperfeição? Quando a imperfeição se divorciará da pecha de hormônios em desordem, de falta de sexo, de TPM? Quando a mulher – também aos olhos da mulher – passará do assombro da exceção à serenidade da regra?
No mesmo dia em que nos limitarmos a ver aglomerados de carne expostos no açougue, não em capas de jornais populares (socados em biquínis de 3 mm). Na mesma data em que senhoritas de apelidos hortifrutigranjeiros se tornarem lenda urbana ou heroínas de HQ. Na mesma ocasião em que abandonarmos o posto de gênero alimentício – consumíveis por natureza: no calendário do ano, na revista do mês, na baladinha da noite. No mesmo instante em que a mulher não for mais “pega”, “comida”, tomada, apassivada, puxada pelo cabelo na boate, sequestrada como sabina pelo fato de ser “delícia” ou “filé” exibido na vitrine, à espera do braço forte que lhe arranque roupas e problemas.
Quando for inconcebível que um dia possa não ser Internacional da Mulher; quando for absurdo reservar um vagão feminino no trem ou metrô, tendo-se qualquer assédio por impensável em algum dos outros; quando for obsoleto celebrar a preponderância da chefe, da vice, da presidente; quando o 8 de março aparecer empoeirado num calendário todo feito de batons e rosas – estaremos finalmente no ponto. Continuamos vergonhosamente crus enquanto o ato de pertencer a uma das metades da humanidade ainda é notícia.
5 comentários:
Nossa , pois é, eu achava que era a única que me revoltava com dia internacional da mulher e as matérias sem noção rsrs
Amei sua postagem...achei seu blog no blog da minha amiga Sayuri...
Beijão!
Eu sou contra o dia internacional da mulher, sempre fui e sempre o serei. E todos me olham torto quando eu falo isso. Mas é verdade. Caramba, somos todos seres humanos, tanto mulher quanto homem! Pra quê toda essa frescura? Ao invés de falarem do mercado de trabalho, deveriam parar com os estereótipos de vez. Enfim, concordo muito com você e com seu texto.
Bjo!
http://miasodre.blogspot.com/
Gostei do post,eu acho que nos dias de hoje,quando falam que a mulher trabalha em uma area as pessoas acreditam que ela nunca deveria estar ali.
http://perfeitamenteteen.blogspot.com
Perfeito, amiga. E, a meu ver, o maior desafio é este mesmo: a mulher se livrar dos estereótipos e preconceitos que ela mesma mantém. Quem sabe um dia a própria mulher deixe de ser tão retrógrada e conformada em relação àquilo que lhe dizem que ela é e possa deixar de ter um dia só para ela...
Postagem muito boa ); Parabéns
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