É o que dizem os atores falantes de inglês para desejar-se sorte antes de entrar no palco. Não sei bem por quê. Há lendas: que na Grécia Antiga, em vez de aplaudir, a plateia batia os pés no chão – e, se batesse com excessivo contentamento, quebrava a perna. Dizem também que na Inglaterra elisabetana, se o público satisfeito não sapecava os pés no chão, fazia isso com os assentos – e se batesse com exagerada satisfação... quebrava a perna. Da cadeira. É duvidoso se as historinhas procedem, mas o break a leg está metaforicamente certíssimo: não se sobe ao palco sem quebrar a perna. O próprio ato de subir ao palco já é quebrar a perna. Estar ali, embora vestido de outrem, é de uma nudez extrema; atirar seu trabalho às feras, ao julgamento dos leões, em tempo real. Ali mesmo a plateia o decifra, o devora, o adora ou despreza, gargalha ou vaia. Disseca-o, destrincha-o, analisa-o picadinho; faz o que quiser daquela autoestima assim entregue, indefesa, abandonada, em situação de fratura exposta.
Ai de nós, de nossos sons e nossas fúrias, se não houvesse o teatro. Se não houvesse espelho tão escrachado e carne-vivo de nossas rudezas – mais dedo-na-ferida do que cinema e TV, já que teatro não admite fugas. Teatro é você na base do corpo a corpo com o ator; é você soterrado pelo texto, pelo gesto, pelas caras e bocas, pelas tragédias e comédias que lhe desabam na cabeça sem o coração fazer pausa de cafezinho, pipoca, banheiro, celular. Se saímos da plateia? saímos, quando a necessidade é maior que o medo de chamarmos atenção indevida do elenco, e de sermos depenados por ele em vez de o depenarmos. Nossos pudores mínimos, porém, desencorajam a aventura, e nos submetemos à orgia de máscaras coletivas para não termos as individualidades desmascaradas. Teatro é opção entre esses dois estupros autorizados. Teatro nos exige ou zomba de nós, ou nos tem ou nos rejeita, ou nos possui ou nos denuncia. Teatro é psicologia em imersão total, é divã hardcore. Teatro é dá ou desce.
Neste 21 de março Universal do Teatro, sente-se à plateia com olhos de perna quebrada, postura vergada, vaidade caída, à disposição do que lhe venha expurgar os (des)conhecimentos tão sólidos e as humanas tolices tão incontestáveis. Que Shakespeares e Brechts lhe deem uma boa hora no parto deste novo ser (ou não ser) que nos brota inevitavelmente em cada peça. Merde pra você.
Ai de nós, de nossos sons e nossas fúrias, se não houvesse o teatro. Se não houvesse espelho tão escrachado e carne-vivo de nossas rudezas – mais dedo-na-ferida do que cinema e TV, já que teatro não admite fugas. Teatro é você na base do corpo a corpo com o ator; é você soterrado pelo texto, pelo gesto, pelas caras e bocas, pelas tragédias e comédias que lhe desabam na cabeça sem o coração fazer pausa de cafezinho, pipoca, banheiro, celular. Se saímos da plateia? saímos, quando a necessidade é maior que o medo de chamarmos atenção indevida do elenco, e de sermos depenados por ele em vez de o depenarmos. Nossos pudores mínimos, porém, desencorajam a aventura, e nos submetemos à orgia de máscaras coletivas para não termos as individualidades desmascaradas. Teatro é opção entre esses dois estupros autorizados. Teatro nos exige ou zomba de nós, ou nos tem ou nos rejeita, ou nos possui ou nos denuncia. Teatro é psicologia em imersão total, é divã hardcore. Teatro é dá ou desce.
Neste 21 de março Universal do Teatro, sente-se à plateia com olhos de perna quebrada, postura vergada, vaidade caída, à disposição do que lhe venha expurgar os (des)conhecimentos tão sólidos e as humanas tolices tão incontestáveis. Que Shakespeares e Brechts lhe deem uma boa hora no parto deste novo ser (ou não ser) que nos brota inevitavelmente em cada peça. Merde pra você.
Um comentário:
Muito bom!
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