quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Mais sinopses distópicas que não sei se há, mas poderia haver


Numa sociedade futuro-ditatorial, bebês não pertencem necessariamente às famílias que os geram: é preciso que os pais apresentem um "projeto de atuação" em até duas semanas após o nascimento da criança, explicando detalhadamente como pretendem educá-la para o bem do processo civilizatório. Acontece que famílias de menor instrução e poucos recursos raramente conseguem dar conta da burô, e em sua maioria acabam perdendo a guarda para casais mais capacitados. Cientes da treta, um casal de recém-pais apela para o extremo: o homem esconde o filho numa galeria subterrânea especialmente construída, e deixa lá sua irmã, tia da criança, como ama de leite (já que ela recentemente perdeu um filho no parto); em seguida, pai e mãe apresentam o cadaverzito do sobrinho como seu – e ganham, na qualidade de consolo estatal, o certificado de parentalidade do bebê morto. Era o que esperavam para poderem acorrer ao esconderijo do filho real e fugir com ele, agora devidamente documentado, antes que as autoridades identifiquem a existência de uma criança sem registro; previsivelmente, no entanto, descobrem que a ama fugiu por sua vez com o pequeno rechonchudo, e se põem na cola da raptora apavorados de que ela venha a ter confiscado o bebê do qual não tem a "posse" oficial.

Em outra sociedade futuro-ditatorial, amores são considerados elementos de desordem e punidos com a forca. Muitos casais sinceramente apaixonados, portanto, precisam armar para que sejam obrigados a casar-se por conveniência, de preferência mostrando uma certa antipatia recíproca.

Uma nova espécie de microvida parece alimentar-se de todas as cores existentes no planeta, que desbota consideravelmente na mesma medida em que os organismos cromofágicos se agigantam.

Um mundo inteiramente agrotoxicado é habitado apenas por humanos que desenvolveram uma resistência específica, mas também alguma espécie de mutação colateral: peles encouraçadas, olhos horrendamente esbugalhados e sanguíneos, substituição dos cabelos por espinhos agudíssimos etc. A verdade universalmente defendida é que somente elementos do mesmo "grupo mutante" conseguem procriar – o que não impede, óbvio, um Romeu que só respira embaixo d'água e uma Julieta que solta fogo a cada fala de se apaixonarem estapafurdiamente.

Como, aliás, toda a gente.

Nenhum comentário: