Há pouquinhos dias, uma amiga queridíssima comentava um dos posts e aproveitava para fazer encomenda: texto sobre o tema “Por que não se dão boas notícias?”. “Cara!” – exasperava-se ela, partilhando minha mais constante aflição – “Todo dia, no jornal, só tem notícias ruins, de mortes, assassinatos, estupros, roubos, tragédias. Onde estão as boas notícias? Por que não são dadas? Não existem?”.
Para defender que existem (e que eu mesma tenho flagrado uma ou outra andando pela rua), lanço mão da celebração americana de hoje, o maluco e adorável Find a Rainbow Day. É bem o espírito da causa. Um manifesto, uma convocação: é hora, meu povo, de acharmos e denunciarmos os arco-íris que caminham aí disfarçados, impunes, à paisana – os safadenhos. Arco-íris que metem máscara e capote para escapar das câmeras, que se enfiam na sombra para não dar entrevista, que se escondem nos becos para não dar as caras no RJ-TV (meu jornal de desestimação). Arco-íris que circulam de peruca e óculos escuros pelo meio de nossas distrações, pelo cantinho de nossas indiferenças, numa vergonha infinita de sair do armário. Alegrias ruborizadas. Felicidades clandestinas.
Pois saiamos do armário as boas notícias! no peito, na marra. Desenterremo-las como criança cavando ovo de Páscoa no jardim. Porque existe arco-íris onde uma cura é descoberta, grande ou miúda, em vacina que resolva ou pomadinha que amenize; existe arco-íris onde nasceu bebê balofo de dobras, pleno de pulmões, completo de órgãos e dedos. Existe arco-íris dançando sobre o primeiro emprego de seu sobrinho, sobre o adolescente que cedeu lugar no metrô, sobre o jasmineiro que está pondo cacho novo, sobre o caqui que está na época, sobre o fim de semana sem chuva, sobre a chuva sem enchentes, sobre a enchente sem vítimas. Existe arco-íris misturado à lua cheia, ao prazo cumprido, ao fim da correção de provas, ao início das férias (sempre alguém está principiando férias), à energia eólica, à mais recente linha de esmaltes, ao presente que nos pôs em esperanças, à viagem que nos deixou em felizes vigílias, ao computador que voltou tinindo do conserto, ao manuscrito de Jane Austen ou Machado recém-surpreendido em alguma gaveta histórica (I wish). Há arco-íris muito aqui, muito agora, muito aquém dos arco-íris grandiosos de Olimpíadas, carnavais e efemérides tais. Arco-íris de esquina, no abraço, no elogio, na promoção – em duplo sentido –, no gol aos 48, no 42 que virou 38, nas 31 velinhas que viraram 32, no bolo que assou 4 minutos antes do pico da fome, nos filhos que hoje só chegam duas horas depois do marido. Existe arco-íris entre parênteses. Nas reticências. Nos etcéteras.
E mesmo nos errejotatevês, no jotaenes: existe arco-íris enfiado entre uma e outra desgraça, pra nos salvar do suicídio. Só não há muitos, ou muito(s) aparentes – para que permaneçamos controladamente chapados, pasmacentamente oprimidos e insatisfeitos, apalermados na dose certa; entre a perigosa revolta e a tristeza aniquilante, entre o cansaço de quem se abre às promessas e a esperança amarguinha de quem vota por elas. A exibição de todos os possíveis e acontecidos arco-íris, como a overdose de beijos em Cinema Paradiso, nos conduziria a uma felicidade histérica e nos deixaria imprestáveis a propósitos de governo. Para executivos, legislativos e judiciários, melhor assim: que os arco-íris fujam aos repórteres, que corram excêntricos, marginais, esquivos como um Papai Noel ou um Belchior, e só de quando em quando nos adentrem as chaminés e joguem 100 ou 200 gramas de contentamento, dois ou três ovos de chocolate, apenas para nos fazer um sinal de Batman, um Z de Zorro. Apenas para que as mídias, alarmadas, limitem-se a entremostrá-las como lendas urbanas.
Para defender que existem (e que eu mesma tenho flagrado uma ou outra andando pela rua), lanço mão da celebração americana de hoje, o maluco e adorável Find a Rainbow Day. É bem o espírito da causa. Um manifesto, uma convocação: é hora, meu povo, de acharmos e denunciarmos os arco-íris que caminham aí disfarçados, impunes, à paisana – os safadenhos. Arco-íris que metem máscara e capote para escapar das câmeras, que se enfiam na sombra para não dar entrevista, que se escondem nos becos para não dar as caras no RJ-TV (meu jornal de desestimação). Arco-íris que circulam de peruca e óculos escuros pelo meio de nossas distrações, pelo cantinho de nossas indiferenças, numa vergonha infinita de sair do armário. Alegrias ruborizadas. Felicidades clandestinas.
Pois saiamos do armário as boas notícias! no peito, na marra. Desenterremo-las como criança cavando ovo de Páscoa no jardim. Porque existe arco-íris onde uma cura é descoberta, grande ou miúda, em vacina que resolva ou pomadinha que amenize; existe arco-íris onde nasceu bebê balofo de dobras, pleno de pulmões, completo de órgãos e dedos. Existe arco-íris dançando sobre o primeiro emprego de seu sobrinho, sobre o adolescente que cedeu lugar no metrô, sobre o jasmineiro que está pondo cacho novo, sobre o caqui que está na época, sobre o fim de semana sem chuva, sobre a chuva sem enchentes, sobre a enchente sem vítimas. Existe arco-íris misturado à lua cheia, ao prazo cumprido, ao fim da correção de provas, ao início das férias (sempre alguém está principiando férias), à energia eólica, à mais recente linha de esmaltes, ao presente que nos pôs em esperanças, à viagem que nos deixou em felizes vigílias, ao computador que voltou tinindo do conserto, ao manuscrito de Jane Austen ou Machado recém-surpreendido em alguma gaveta histórica (I wish). Há arco-íris muito aqui, muito agora, muito aquém dos arco-íris grandiosos de Olimpíadas, carnavais e efemérides tais. Arco-íris de esquina, no abraço, no elogio, na promoção – em duplo sentido –, no gol aos 48, no 42 que virou 38, nas 31 velinhas que viraram 32, no bolo que assou 4 minutos antes do pico da fome, nos filhos que hoje só chegam duas horas depois do marido. Existe arco-íris entre parênteses. Nas reticências. Nos etcéteras.
E mesmo nos errejotatevês, no jotaenes: existe arco-íris enfiado entre uma e outra desgraça, pra nos salvar do suicídio. Só não há muitos, ou muito(s) aparentes – para que permaneçamos controladamente chapados, pasmacentamente oprimidos e insatisfeitos, apalermados na dose certa; entre a perigosa revolta e a tristeza aniquilante, entre o cansaço de quem se abre às promessas e a esperança amarguinha de quem vota por elas. A exibição de todos os possíveis e acontecidos arco-íris, como a overdose de beijos em Cinema Paradiso, nos conduziria a uma felicidade histérica e nos deixaria imprestáveis a propósitos de governo. Para executivos, legislativos e judiciários, melhor assim: que os arco-íris fujam aos repórteres, que corram excêntricos, marginais, esquivos como um Papai Noel ou um Belchior, e só de quando em quando nos adentrem as chaminés e joguem 100 ou 200 gramas de contentamento, dois ou três ovos de chocolate, apenas para nos fazer um sinal de Batman, um Z de Zorro. Apenas para que as mídias, alarmadas, limitem-se a entremostrá-las como lendas urbanas.
(Mas que grande e coloridamente las hay, las hay.)
2 comentários:
Poxa, seus textos são ótimos.
Maravilhosa escrita, parabéns.. tão bom entrar em um blog e se depara com conteúdo que valha a pena!
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