sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Palavras que vivem na sombra


Amo e me desespero ao descobrir o Atlântico de nossa ignorância no próprio idioma. Não que não sejamos fluentes, nele, para tudo que interessa, e que não nos viremos perfeitamente inclusive inventando alternativas para o que escapa. Mas não dá uma certa vertigem deparar com palavras que sempre estiveram ali observando, observando sem termos sequer ideia, feito fantasmas do vocabulário ou documentos que dormem nas gavetas, sendo que acordados poderiam simplesmente alterar a História? Sei lá, acho um bocadinho perturbador trabalhar com sinônimos diuturnamente e nem assim ter a mais vaguíssima NOÇÃO de todos quantos vivem na sombra.

Concionar, por exemplo, significa "anunciar" – já tinham esbarrado com essa pérola? Ensanchar, sabe-se lá por quê (imagino que não por consideração ao grande Sancho Pança, mas jurar, não juro), quer dizer "aumentar o preço ou a importância de algo"; gostaria bem de averiguar se os mercados têm consciência de estarem nos ensanchando o custo de vida que nem bestas insanas: ficariam, imagino, obstupefatos. Também fico obstupefata, obstúpida, contérrita, zaranza com a quantidade de opções no português para embasbacar-nos; certamente uma premonição – e um mau sinal.

Mas não se sarapantem por tão pouco, tem mais, tem de mais: um ser bonito como NÃO é o Brasil de agora pode bem ser venusto; um vil e sórdido como o atual chefe do Executivo (dicas, meus amores; anotem) é sem dúvida terrulento, moncoso, refece, túrpido, já que deixa nossa situação cada dia mais pesada, exaustiva, ímproba. Sim, andamos cercados de ladrões – agadanhadores, malandréus, pandilheiros, ventanistas, pechelingues –, e há que ser muito serenos, muito quiescentes, para sairmos vitoriosos no prélio. Claro, é dureza para todo mundo; desnecessário envergonhar-se, ou ficar encalistrado, se de repente se incorre em vacilo, em cincada; brasileiro que é brasileiro nasce trabalhado na esperteza, no paleio, na solércia, e cedo ou tarde arruma jeito de destruir totalmente – profligar mesmo – as trapaças, aldrabices, baldrocas e tranquibérnias que andam nos armando.

No enquanto-isso vamos descobrindo, nos instruindo e aletradando.

Nenhum comentário: