segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Desfanfarra


Li uma matéria interessantíssima sobre como os fogos de artifício – esses terrores barulhentos que atormentam bichos, bebês, idosos, pessoas autistas – poderiam ser substituídos sem perda alguma de magia e belezume. Algumas alternativas citadas na matéria: enxame de drones (coisa realmente extraordinária, conforme pudemos constatar, inebriados, na abertura das Olimpíadas); lança-chamas (siiiim, a empresa Arcadia tem feito isso na Inglaterra – botado uma aranha gigante para soltar lasers e bolas de fogo pra cima, em grandes eventos); projeções no céu (diz que um artista britânico chamado Dave Lynch – e esse nome parece falar por si mesmo – já estampou cenas dum cavalo galopando nas nuvens de Nottingham, o que deve ter sido uma boniteza, mas é vero que funciona só em dias nublados); aurora boreal artificial (o HAARP, projeto baseado no Alasca, consegue sim reproduzir a maravilha com antenas de transmissão que emitem ondas de rádio); e uma caçambada de balões de hélio (coloridos, espetaculares e de menor custo, porém capazes também de provocar acidentes ao assustar animais, por exemplo). Um tanto de ideias meio doidas, meio lindas que me empurraram para as mesmas considerações: como, enfim, trocar por peripécias inocentes as formas de celebração atuais, que tanto berram? O que tascar no lugar da pirotecnia sem que a farra perca a graça e a grandeza?

O que me vem primeirinhamente à cabeça é que a projeção de luzes faria eventos soberbíssimos, se em vez das nuvens duvidosas (na Inglaterra é fácil contar com elas, né, bebê?) se usasse como tela uma chuva de papeizitos brancos biodegradáveis, quiçá alimentadores de peixes, caso a empreitada se realizasse sobre o mar. Os próprios papeizinhos, aliás – agora já em cores mildiferentes –, ocupariam como reis o posto de atração da festa: se é possível programar drones para desenhos milimetricamente sequenciados no ar, por que não dar um jeito de atirar os papeizinhos de maneira que, por alguns segundos, formassem fotos, paisagens, mensagens? Ou por que não providenciar que os papeizitos fossem (certo, não digo dinheiro, é querer levemente muito) uma mistura de pequenos recados fofos com vales e brindes que choveriam alegrias em milhares de mesas?

Outro delírio fim-de-anista que eu amaria particularmente: bilhões, trilhões, quintilhões de bolhas de sabão perfumadas que tornariam quase místico o réveillon das gentes portadoras de infância. E por falar em perfume, cadiquê não trocar o império de um sentido (quer dizer, dois – visão e audição) pelo de outro, e fazer o ano virar sob um espalhamento mágico de essências que poderiam ser exclusivas daqueles 365 dias, transformando-se em outra fragrância no ano seguinte? Alô, Boticário! bora agitar isso daí. Ah, com igual encanto n'alma eu vibraria de as entradas serem comemoradas com tempestade de tsurus e demais origamis lindinhos. E pétalas! Muitas, muitas pétalas. Aliás, flores inteiras e frescas que fossem direto para lapelas, cabelos, decotes, vestidos; ou que viessem em forma de sementes, caso o cenário se fechasse em terra e não em areia. Vida em sugestão e promessa, cores, maciezas – tudo que coerentemente se desejaria para um calendário que se abre, na sã e limpa consciência dos justos.

Paz na terra a todos os corações que não merecem nem carecem escândalo para avançar no tempo de verdade. Paz a todos que se empenham no silêncio de boa vontade.

Nenhum comentário: