sábado, 15 de agosto de 2020

Não quero saber

 Esboço de bolhas de discurso mão desenha Foto stock gratuita ...

Não quero saber se o filho do Gugu posou com a namorada, se a Lexa exibiu as celulites, se o Alok fez chá de revelação (gente, chá de revelação é too much pros meus nervos; não critico, só não aguento), se a ex-ronaldinha (o que pitombas é uma "ex-ronaldinha"??) ganhou 500 mil por pornô, se a Miley Cyrus elogiou o ensaio nu da Anitta. Quero saber se e como essas pessoas superaram seus maiores medos de infância; quero saber o que sentiram quando viram seu primeiro filme ou fizeram a primeira viagem, qual é a reação mais imediata de seu estômago ao presenciar uma injustiça, onde escondiam seus diários ou bilhetes do crush ou o que mais tivessem de excessivamente precioso. Quero saber por que se ligaram a seus santos de devoção, se os têm; por que suas cenas favoritas no cinema são suas cenas favoritas no cinema; por que a descoberta de que Papai Noel não existia lhes foi ou não foi dolorosa. 

Não quero saber se o Ronnie Von construiu uma casa de 3 mil metros quadrados, se a mãe do Neymar fez harmonização facial, se a Gracyanne rebateu críticas sobre seu corpo, se Meghan e Adele frequentam aulas de pilates juntas, se a tatuagem da Dua Lipa parece o Ratinho. Quero saber como esse povo lida com a inevitabilidade da morte, como imagina que seja o além-dela, como chama alguém para uma conversa imensamente difícil, como se posiciona com relação à economia imensamente desigual, como acredita que os criminosos devem ser reeducados, como se comporta ao receber notícias falsas. Quero saber de seu choque feliz ao ler o melhor livro da vida, de seu grau de enfofuramento ao encontrar um filhotinho, de seu encontro inaugural com o mar, das razões profundas de suas cores favoritas, dos maiores encantamentos de sua experiência humana.

Pouco me importa que Geisy tenha falado de Bruna, que a Maiara tenha ostentado o corpão à beira da piscina, que a Melody tenha criado um namoro fake, que a Kalimann tenha mantido o sobrenome do ex, que a Piovani não tenha comido lagostins na Suécia, que a Gavassi tenha ficado loura para personagem misteriosa. Importa-me exclusivamente que estejam ou não estejam realizadas com todos os seus feitos lá no cantinho d'alma, que gritem ou não gritem contra a destruição de fauna e flora, que contribuam ou não contribuam para o debate dos velhos privilégios, que combatam ou não combatam a profusão de preconceitos, que defendam ou não defendam as classes mais desamparadas. Não ligo para suas pendengas, suas fofocas, suas tinturas, seus pesos, seios, cabelos, alturas, maquiagens, biquínis, calcinhas – e sobretudo desprezo o "jornalismo" dedicado a flagrar e coisificar mulheres, tornando-as tão mais holofotáveis quanto mais produtos. De suas medidas, interessam-me apenas as que tomam para fazer o planeta possível, a vida viável. De suas formas, só me afetam aquelas que encontram para fomentar sorrisos. Tudo mais que as destaque não é de minha alçada; de tudo mais que se divulgue vejo somente as manchetes que nos atropelam, que se atiram em nosso colo, pedindo amor e cliques. Não clico, mas também não posso desler – e agradeceria penhorada se me deixassem não saber tudo quanto há a ser perfeitamente insabido. 

Seduz-me descobrir como se constrói um humano por dentro. O que mais se desesperam para mostrar é o que existe de menos novo sob o sol.

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