sexta-feira, 26 de março de 2021

Fazendo a festa


Adoro o fato de que hoje, para os americanos, é o Make Up Your Own Holiday Day, ou Dia de Criar Seu Próprio Feriado – ideia implantada por Ruth e Thomas Roy, casal da gringa que é especialista em criar seus próprios feriados; os doi(do)s, juntos, já meteram entre setenta e oitenta dessas datas malucas no Chase's calendar of events, publicação anual começada pelos irmãos Chase em 1957, na terra do tio Sam. Entre as festividades lokonas boladas pelos Roy, andam pérolas como o Dia de Responder à Pergunta do Seu Gato (22 de janeiro), o Dia de Perdoar Mamãe e Papai (18 de março), o Dia de Abraçar um Australiano (26 de abril), o Dia de Não Pisar numa Abelha (10 de julho), o Dia da Poesia Ruim (18 de agosto), o Dia de Ficar Longe de Seattle (16 de setembro), o Dia do Querido Diário (22 de setembro), o Dia de Dar Nome ao Computador (20 de novembro), o Dia de Permanecer em Casa Porque Você Está Bem (30 de novembro); quase tudo nessa toada. Organizando direitinho, Thomas e Ruth conseguem providenciar bobagens calendárias para todos os gostos.

Não sendo eu exatamente uma escondedora de minha queda por umas tais sandices, preciso nem avisar que supertopo o feriado de gerar feriados, e já começo indelongamente cravando um para hoje: que tal o 26 de março para Dia da Tradução das Fábulas de Esopo, em homenagem à publicação da cuja por William Caxton, nesta data, em 1484? Diz que esse Caxton foi o primeiro impressor em inglês e editou (lá pra 1475) o primeiro livro em língua inglesa, daí a puxadinha de saco potencial; fica a dica, Roy. Ainda nos domínios deste mês, pego o 29 para Dia do Hífen, já que este quadradito da folhinha representou em 1990, na ex-Tchecoslováquia, o início oficial da batalha gramático-política de como renomear o país após o declínio da URSS. Na chamada Guerra do Hífen não se disparou nada a não ser, no máximo, alguns impropérios e talvez umas tintadas de caneta, mas a trip do junto-separado-maiúscula-minúscula-hífen-travessão cresceu tão portentosa que, em 93, foi República Tcheca para um lado, Eslováquia pro outro e não se fala mais nisso. Gente: MUDAR O MAPA por causa dum dilema de grafia do substantivo é MUITO o cotidiano de quem dá a volta QUE FOR para fugir do termo duvidoso e miserento. O feriado não pode moralmente ser outro.

Deixo também agendado, para 11 de junho, o Dia de Dar o Crédito ao Verdadeiro Autor. Cadiquê? Nesse dia, em 2002, o Congresso dos Estados Unidos reconheceu que o inventor do telefone foi realmente o italiano Antonio Meucci, não o danadjenho do Graham Bell. Pois é, menino, teve essa treta: Meucci bolou em 1856 um aparelho que apelidou de teletrofone, para se comunicar de seu escritório com o seu quarto no segundo andar da casa, uma vez que a senhora Meucci sofria de reumatismo; só que, com a grana curta, o italiano (morador dos EUA) pôde pagar apenas uma patente provisória. Mandou a ideia para a empresa Western Union, que não se interessou e ainda avisou ao inventor, mais tarde, que seus projetos tinham sido perdidos. Não é que dois anos depois o Graham Bell, essa fofurinha que já havia dividido um lab com o colega europeu, meteu-lhe uma bola nas costas, conseguiu a patente do telefone e fechou negócio com a Western Union? Meucci só não ganhou o processo contra Bell porque faleceu antes, e cá estamos quase todos nós, ainda em 2021, celebrando o fura-olhos ao lhe atribuir a autoria surrupiada. Pa-ti-fa-ri-a.

Posso brincar de mais unzinho? Põe aí então: 26 de outubro, Dia do Eu Não Deveria Ter Criado Essa Bosta. Nada não, só um leve ressentimentozito pelo lançamento daquele estrupício do Windows 8 em 26/10/2012 – AQUELA porcaria horrorosa e inútil que se enfiou entre os ótimos irmãos 7 e 10. Nunca saberemos o que acometeu o sistema nervoso de quem, certa feita, pensou durante o banho: "Ei, por que não um Menu Iniciar que desaparece, se esconde e pipoca apenas nos piores momentos para atrapalhar com toda a eficiência o que está sendo feito?". Quase uma década depois, estamos abençoadamente livres desse flagelo, dessa abominação, porém nunca se sabe; o ser humano apresenta uma tendência preocupante para ter as mesmas ideias execráveis várias vezes na História, o que me faz abraçar como prudente a instituição de um memorialismo profilático. E já que profilaxia está em pauta, por favorzinho – finjam que já existe a festividade que nem tive tempo de inventar, o Dia de Perdoar o Cronista Enfadonho (sim, peguei carona naquele com Papai e Mamãe, AND PROUD), e considerem aplicação imediata para todos os efeitos. Antes que meus últimos tracinhos de crédito junto aos quatro leitores pacientes se completo-espatifem.

(Com hífen?)

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