terça-feira, 16 de março de 2021

Para todos os garotos


Interessantíssima a atitude da mãe norte-americana de quatro filhos Tara Ahrens, que resolveu incrementar o material escolar de sua dupla de meninos adolescentes com itens (lamentavelmente) incomuns: "Meus dois filhos, Micah e Elijah, têm absorventes internos e absorventes higiênicos nas mochilas, para o caso de uma amiga deles precisar. Sou uma mãe que está apenas tentando quebrar os tabus de gênero". Tara defende lindamente que as escolas "deveriam oferecer proteção sanitária gratuita aos alunos", diz que as gurias do colégio lidaram bem com a inesperada farmacinha dos boys e procura sempre desenvolver nos garotos a sensibilidade com relação às questões – em tese – femininas (Micah e Elijah ajudaram a comprar os primeiros sutiãs da irmãzita, por exemplo). QUE MULHER.

Estou simplesmente apaixonada pela visão e pela iniciativa da sra. Ahrens – iniciativa que, confesso, não sei se com todo meu feminismo eu tomaria por conta própria, caso tivesse um filho adolescente; não, claro, por acreditar que "isso não é problema de menino" ou algo assim, mas pela cândida razão de provavelmente não haver atinado para uma ação que agora me parece tão óbvia. Mulheres desde cedo aprendem a levar absorventes na bolsa, desde cedo se acostumam a ceder os danados às amiguinhas surpreendidas por fluxos impertinentes; porém não ocorre às mães, aos pais, aos irmãos, às irmãs que a menstruação e todos os demais fenômenos ligados à sexualidade/reprodução humana são exatamente isso, HUMANOS – e não exclusivamente femininos. Gravidez, orgasmo, DSTs, TPM, contracepção, menopausa, disfunção erétil, tudo diz respeito a todos; tudo afeta a vivência de todos. Então sim, é perfeitamente cabível e recomendável que os moços raciocinem em benefício das moças e estejam preparados para fornecer um item básico de higiene, por que não? Não é comum que peçamos ao/à colega um tiquinho de pasta de dente, um pedacito de fio dental, um pouco de papel higiênico porque o banheiro neste momento está sem? "Ah, mas isso é coisa que todo mundo usa, independentemente do sexo." Eita argumento egoísta, porém ainda que o levássemos em conta: não é comum que mulheres andem com camisinhas masculinas, just in case? Como a própria classificação indica, não são elas-mulheres que as vestirão. "Aaaaah, mas é para elas também, que vão se proteger de doenças, de gravidez indesejada etc." Certo: vão proteger-se e vão protegê-LOS, é via de mão dupla. Além do mais, seria a tonga da mironga do kabuletê social considerar que estamos restritos a pensar uniquissimamente no NOSSO bem-estar imediato, e não podemos carregar um objetozinho de 1g na mochila sem um ganho pessoal e intransferível. Que tal ao menos levar em conta, como "efeito prático", a chance de mostrar que é um homem evoluído e respeitador o bastante para entender o conforto das garotas ao redor como o seu próprio? Mal não faz, superjuro.

Infelizmente não ouvi falar, até o momento, de outro case em que a família tenha educado seus rapazes para portar absorventes em intenção das amigas – virou notícia não foi à toa; mas quero crer que o fato de ter virado notícia representará um "oooolha que legal, nunca tinha pensado nisso!" para muitos papais, mamães, moçoilos cuja ficha apenas estava em suspenso, só faltava aquele peteleco exemplar para se tornar tendência e motivação. Sem dúvida eu mesma adotaria o costume, e já cresceria os guris (se desde o início houvesse atentado para a ideia) perfeitamente habituados a levar entre suas coisinhas uma ou outra utilidade para a mamãe, a irmã, por extensão todas as meninas de sua convivência. Isso, em especial, ainda está looooonge de ser praxe; o consolo é que já sinto entre os alunos ao menos uma à-vontadice consideravelmente maior no que diz respeito às questões menstruais: as fofas não coram nem se apavoram mais com tanta frequência ao pedirem para sair de sala em caso de sinal vermelho, entregam absorventes umas às outras na frente dos meninos e às vezes circulam com eles (os absorventes, não os meninos) muito abertamente na mão, rumo às toaletices necessárias. Os fofos, por sua vez, também não parecem mais encarar com o antigo e tolo constrangimento a dinâmica menstrual de suas amigas, nem veem mais sentido em ficar rindo paspalhamente de fatos que todos conhecem à farta. Não é decerto a evolução total, mas é uma bem considerável alguma-coisa – uma remada cada vez mais vigorosa e colaborativa na direção oposta à dos velhos tabus com cheiro de mofo, das ridiculices caducas com rubores de machismo e hipocrisia, das vergonhas com ares de patriarcado milenar que enclausura as donzelas no gineceu e acha um descalabro ter algum conhecimento de suas impurezas. Affffff à centésima potência.

Guys, mirem-se no exemplo dos jovens Ahrens e se trabalhem no sentido de transformar-se nos homens que vocês desejariam ao lado de suas (futuras) filhas. Aliás: com ou sem filhas imaginárias, incondicionalmente, apenas porque o que afeta um afeta todos, trabalhem-se; sejam – PORQUE SIM – mais empáticos, mais sensíveis, mais atentos, mais competentes para o que o mundo evoluirá até ser. Um pequeniníssimo passo para um homem pode configurar um abraço de solidariedade numa mulher e um salto gigante para a humanidade. Ninguém merece, não é, meus queridos? ninguém merece continuar caminhando num planeta tão bitolado e tacanho como costumava ser um tempinho atrás.

Naqueles dias.

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