terça-feira, 27 de abril de 2021

Cenas do último capítulo


O ano foi de muito menos idas ao cinema (no nosso caso, nenhuminha após a corongação do planeta – um salve para o streaming em situações de colapso mundial!); boa parte do público não viu nada de nada, ou pouco de pouco. Ainda assim o diretor Steven Soderbergh, responsável pela cerimônia oscarizante de domingo, achou uma ideia bacana nos ir mostrando um mooonte de pessoas desconhecidas, agradecer por seus trabalhos e falar de suas particularidades individuais EM VEZ DE exibir trechos das respectivas produções, ou mesmo desfiar sinopses. Um tiro em todos os pés, mãos, asas, garras e tentáculos de uma indústria que é eminentemente visual e sempre seduziu na base de clipes e trailers; não poderia dar num evento mais equivocado e enfadonho.

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(CLARO que é legal valorizar essas pessoas que são, do nosso ponto de vista, quase anônimas porque backstagees. Mas focalizá-las praticamente o tempo todo, além de deixá-las nitidamente desconfortáveis, roubou um pedaçaço da atenção que deveria ter ido para seus próprios feitos. A gente em casa quer VER um tiquinho que seja das atuações, da direção de arte, da maquiagem, dos figurinos, quer ter uma amostrinha dos curtas e longas que não estamos conseguindo acompanhar a contento; tem ALGUM cabimento transformar o maior portfólio anual do cinema – ao menos o mais popular e, consequentemente, o mais vitrínico – numa longa tagarelação sem imagens? Tem, meus amigos???... Só vou me aquietar quando disserem que fomos cobaias duma cerimônia experimental e que em breve receberemos convites oficiais para a alegre cafonalha de sempre.)

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Triste demais o fato de Os 7 de Chicago, com sua montagem excepcional, sua afinação de elenco e seu roteiro esperto, haver saído sem estatuetas, enquanto uma obra medíocre como Mank papou duas (de Melhor Fotografia e Melhor Design de Produção; mas SÃO duas). Caso abram a Netflix e espiem o catálogo em dúvida, hesitem não: assistam ao primeiro.

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Prêmio de Maior Fofura: Youn Yuh-jung, oscarizada como atriz coadjuvante por Minari, macarronando um inglês adorável e dando sua flertadinha com Brad Pitt, porque afinal, né? Melhores Figurinos de Gala: Amanda Seyfried e Carey Mulligan flutuando em nuvens principescas, respectivamente vermelha e dourada, para deslumbre de nossos olhos prosaicos que mereciam um bocadito de futilidade adoçando um evento quase desesperador. Melhor Pessoa (empatada com Glenn Close e sua reboladinha): a tão fofa quanto poderosíssima Chloé Zhao levando apenas o SEGUNDO – de centenas por vir, esperamos – Oscar de Direção dado a uma mulher, em 93 anos de premiação. Não consigo não dizer que Chloé, com suas indefectíveis trancitas, vestido dourado-opaco e tênis, estava um perfeito personagem de Star Wars; e digo isso encantadamente, como o mais carinhoso elogio à doçura e sabedoria jedi que ela parece emanar. Que a Força esteja com a carreira dessa guria.

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E as Framboesas da bizarrice: céus, o que foi aquele In Memoriam que só pode ter sido editado por Usain Bolt, impossivelzão de acompanhar sem olhos mutantes? Falta de tempo não havia de ser, visto que se despendeu um bom bloco com uma mui constrangedora tentativa de joguinho musical, ao qual só a sempre animada Glenn Close se dignou a ceder alguma espécie de entusiasmo. Outra decisão pasmosa – aliás, THE decisão pasmosa – do roteiro foi não guardar o prêmio de Melhor Filme para cerejar a noite, como se o aniversariante cismasse de soprar velinhas no meio da festa. Acabou naquela não entrega desanimadora do Oscar de Melhor Ator para um Anthony Hopkins que dormia em casa e nem sabia ter levado o troféu (embora eu não discuta, claro, o acerto de concedê-lo ao eterno Hannibal, cuja atuação realmente engoliu a dos demais, segundo todas as vozes; ainda não vi Meu pai, mas tenho zero dúvida a respeito). Só não foi um encerramento mais brochante, pelo menos para mim, porque pude coliriar-me um tantinho com a presença de Joaquin Phoenix fechando os trabalhos – se bem que é como o crítico Hélio Flores comentou sem muitas alvíssaras no Twitter: "Faz todo sentido o Joker terminar esse #Oscars sozinho no palco, né?". É. Lamentável e inegavelmente.

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Já que estamos falando de fazer sentido, e o Steven Soderbergh que também dirigiu Contágio, hein? Sei lá, só uma coisa que o Fábio lembrou aqui.

(And the world goes to...?)

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