quarta-feira, 12 de maio de 2021

Como você vai salvar o mundo


Numa dessas páginas de motivações para desmotivados, algumas autoperguntas interessantíssimas; sobretudo esta roubadora de sono tão terrível de simplicidade: "Como você vai salvar o mundo?".

Porque você VAI salvar o mundo, certo? isso não se discute, já passamos de fase aqui, e agora só nos resta combinar como. Precisamos sentar e organizar de uma vez, direitinho, essa agenda inexorável, esse compromisso que você vai ter de cumprir mais dia menos dia; dê-se um bom gole de ar e pronto, partiu resolver com ligeireza o assunto, feito telefonema para a tia no aniversário. Prefere com múltipla escolha? Formulário do Google? Okeeeeei, vamos lá; já, já acabamos.

Primeiro bloco de possibilidades: usar sua profissão como o Capitão América usa o escudo, o Thor usa o martelo, o... você entendeu. Dar aulas, por exemplo – e não, nem é essencial aparecer em matéria do Fantástico por caminhar duas horas no mangue e avançar mais três em lombo de jegue até deliverar cada tarefa de escola na casa de cada aluno. Graças aos céus por aqueles que o fazem, mas se você suar a camisa para ensinar interpretação de texto, noções sólidas sobre como funciona o esquemão de classes sociais, informações históricas suficientes para desmascarar velhas causas e velhos efeitos, matemáticas suficientes para prevenir engodos, boas geografias e ciências para evitar a defesa de teses mortalmente ridículas, está de otimíssimo tamanho. Não é seu caso o de dar aula? problema nenhum, o que não falta são aulas a dar: de como temperar comida, aplicar papel de parede, fazer arte para transformação dos olhos, fazer olhos voltados para a transformação da arte, montar computadores, projetar carros (ecológicos), projetar pontes (concretas e abstratas), promover coleta seletiva, desenvolver vacinas, desenvolver narrativas, contar histórias. Escutar histórias – porque um passo colossal para a salvação do mundo é ter mais gentes ouvidas.

Não precisa ser coisa de profissão, claro, tem toda a razão, escancaremos o leque. Você pode ser o personal supermercader dos vizinhos idosos; pode fazer campanha de doação de sangue na família, no prédio, na rua, no bairro, na firma; pode arrecadar alimentos para funcionários desempregados; pode plantar alimentos numa hortinha pública; pode adotar o catioríneo encontrado na estrada; pode virar vegetariano ou vegano (não, eu não sou; sim, gostaria de ser); pode cuidar do bebê de sua vizinha que saiu a distribuir currículos; pode postar, postar, postar militantemente na internet; pode doar brinquedos para crianças que não tiveram ainda chance de se praticar como crianças. Mas pode também – há vagas para todos, para tudo – ser o melhor filho, melhor pai, melhor mãe, melhor tia, melhor avô, melhor marido ou esposa que alguém jamais haverá considerado ter na vida, e amar amar amar amar amar amar amar amar esse recipiente de amor sem dúvidas, sem pausas, de janeiro a janeiro.

Bem disse o Talmud (A lista de Schindler sublinhou-o): quem salva uma vida, salva o mundo inteiro.

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